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O Estabelecimento da Kabbalah na Provença

As Chassidut no sul da França

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Entre os anos medievos de 1150-1200, apareceu o Sepher ha-Bahir, ostensivamente uma forma de Midrash antigo. Esta obra fora editada com base em uma série de outros tratados que vieram, originalmente, da Alemanha e do Oriente, na maior parte da Babilônia.

Glossário da Aula 06

  • Sepher ha-Bahir - Bahir é um trabalho místico anônimo, atribuído a um sábio rabino Nehunya ben HaKanah do século I (um contemporâneo de Yochanan ben Zakai) porque começa com as palavras, "R. Nehunya ben HaKanah disse". Também é conhecido como Midrash do Rabbi Nehunya ben HaKanah מִדְרָשׁ רַבִּי נְחוּנְיָא בֶּן הַקָּנָה.

  • Sod ha-Ychud - Um novo conceito que significa "O mistério da Unidade".

  • Chochmat ha-Nefesh - A ciência da alma (psique), obra publicada no ano 1876, 3c.

  • Ma'asseh merkavah - a prática da Carruagem divina - a meditação judaica.

  • Ma'asseh bereshiyt - Ma'aseh Bereshit, seguindo Gênesis 1, compreende a cosmogonia dos tempos talmúdicos Ma'aseh Merkabah, com base na descrição da Carruagem Divina em Ezequiel 1, e em outras descrições proféticas de manifestações divinas, como a de Isaías 6, está preocupada com as visões teosóficas daqueles tempos.

  • Kavod - A Glória Divina

  • Aggadah - Aggadah (em hebraico: אַגָּדָה ʾAggāḏā ou הַגָּדָה Haggāḏā; Aramaico babilônico judaico: אַגָּדְתָא ʾAggāḏəṯāʾ; "contos, contos de fadas, lençol") é a exegese não-legalista que aparece na literatura rabínica clássica do judaísmo, particularmente no Talmud e Midrash.

  • Shechinah - Shekhinah, do hebraico: שכינה, "habitação", "assentamento", é uma palavra utilizada para designar a habitação ou presença de Deus (cf. divina presença), especialmente no Templo em Jerusalém.

  • Aeons - Aeon (do grego αιώv, transl. aión), Eon, Éon ou Eão são todas as entidades emanadas de Deus na mitologia gnóstica, que geralmente aparecem em pares ou sizígias no Pleroma. Seus nomes geralmente denotam qualidades mentais ou espirituais, como Pistis (fé), Sophia ou Protenoia (previsão), ou conceitos importantes do gnosticismo, como o anthropos (homem) ou o pneuma (espírito). Na mitologia gnóstica, Sophia é o éon mais comum. Portanto, contra o desejo do Demiurgo e seus arcontes, que normalmente criam an alma e o corpo, um éon contribui para a criação da humanidade dando espírito aos humanos.

  • RAZA RABBA, SEFER (Aram. סֵפֶר רָזָא רַבּא; "O Livro do Grande Segredo"), uma obra de *Merkabah místico que não existe mais como uma entidade separada. Que ela existia, no entanto, não pode ser duvidado. Vários autores do Oriente Próximo, palestinianos e babilônios dos séculos IX, X e XI que atestam a sua existência foram descobertos por Jacob Mann (Mann, Texts, 2 (1935), 74-83).

  • Kavanh, que no judaísmo é chamado de כַּוָּנָה, que significa literalmente "intenção" ou "direção", é an atitude ou mentalidade que se tem ao fazer os deveres religiosos, especialmente uma oração.

    Maimônides disse que para alcançar a kavanah quando orar, uma pessoa deveria se colocar mentalmente na presença de Deus e se livrar por completo de todas as preocupações do mundo.

  • Chovot HaLevavot (em árabe: كتاب الهداية إلى فرائض القلوب; em hebraico: חובות הלבבות; em português: Deveres dos Corações) é a obra principal do rabino judeu, Bahya ibn Paquda, com o nome completo Bahya ben Joseph ibn Pakuda. Acredita-se que o rabino Ibn Paquda tenha vivido em Zaragoza, Al-Andalus no século XI.

A gnose judaica

Assim descreve o historiador Gershom Scholem a influência por trás do Sepher -ha-Bahir:

"Esses primeiros estágios estavam conectados com a existência de uma tradição gnóstica judaica, associada, em determinados círculos orientais, com o misticismo da Merkavah. Os principais vestígios forma incorporados nas primeiras partes do Sepher ha-Bahir e também em alguns poucos registros preservados nos escritos dos chassídicos asquenazes. O Sepher ha-Bahir, ostensivamente um Midrash antigo, apareceu na Provença em algum momento entre 1150 e 1200, mas não depois disso; ele foi aparentemente editado lá a partir de uma série de tratados que vieram da Alemanha ou diretamente do Oriente."

Cabala, p 61. Gershom Scholem

A obra Sepher ha-Bahir possui opiniões que não eram correntes na Provença e na Espanha, e isso fica bastante claro no comentário sobre o Sepher Ietsirah por Judá b. Barzilai, que foi escrito no XII século e que contém tudo o que o autor conhecia das tradições da ma'asseh bereshit e, em especial, da ma'asseh merkavah.

Na "Enciclopédia de Filosofia Routledge" online, nos apresenta uma visão que bem resume a natureza da Qabbalah, nos seguintes termos:

Veja a tradução abaixo.

O Sumário do Artigo

Kabbalah, uma coleção de escritos místicos judeus, tornou-se significativa em Provence ao final do século XII. Foi recebido com diferentes graus de entusiasmo em um esforço para descobrir o lado esotérico do Judaísmo. A Kabbalah é dividida em duas principais tradições. A primeira é centrada na compreensão de Deus por meio da pesquisa de seu nome. A segunda é uma tradição teosófica que se aproxima de Deus por meio de sua influência na criação. In both accounts, the ten Sefirot are a means by which God connects to the world. These hypostatic numbers serve as a bridge between the Infinite and this world and, among other functions, help explain how a being that is entirely ineffable can create so much variety as can be seen in nature. Devido à disposição de Deus para estabelecer uma relação com o mundo, seus criaturas têm an oportunidade de adquirir uma compreensão íntima de si mesmo. No entanto, essa compreensão só pode ser adquirida por meio de esforços espirituais arduos e difíceis. As obras escritas pelos Kabbalists consistem em uma mistura de conceitos filosóficos e místicos com o objetivo de descobrir o significado profundo da fé. Essas obras são exemplos de uma corrente criativa e influente que tanto atrai como contribui para a filosofia judaica.

Fonte do artigo: Routledge Encyclopedia of Philosophy

Também, no site "My Jewish Learning" encontramos as seguintes observações:

Site fonte do artigo

Artigo em original, veja a tradução abaixo.

Tradução em português:

Uma pergunta inevitável é como a misticismo judaica conseguiu se espalhar de Palestina e Babilônia para o sul da França e a Baía do Reno. A resposta, e não a última vez, é que ela seguiu uma linha de terror e sangue judeu. Quando o Islam começou, as relações entre os judeus e os islâmicos em Palestine e Babylonia eram bastante amigáveis; isso foi tão amigável que Jewish mystics foram expostos aos métodos de meditação dos Sufis e adaptaram seus métodos livremente. No entanto, quando Mohammed e seus seguidores descobriram que os judeus não queriam se converter ao novo culto, houve um certo conflito. As divergências se transformaram em verdadeira perseguição com o surgimento do movimento extremista Almohade.

Mais uma vez, o Gershom Scholem, na sua obra "Cabala" na página 61, nos acrescenta um dado importante:

"Em sua interpretaçãodas dez Sefirot do Sepher Ietsirah nao há mençãoa elas como "aeons" ou atrubutos divinos, ou como poderes dentro da Merkavah, como aparecem no Bahir. O comentário dele é (Judá b. Barzilai) é totalmente impregnado de do espírito de Saadia Gaon, muito diferente do Bahir, que é totalmente despreocupado de ideias filosóficas ou de qualquer tentativa de reconciliar a filosofia com os conceitos que a obra propõe. Escrito na forma de interpretações de versículos bíblicos, particularmnte passagens de caráter mitológico, o Bahir transforma a tradição da Merkavah em uma tradição gnóstica relativa aos poderes de Deus que se encontram dentro da Glória Divina (Kavod), cuja atividade na criação é aludida através da interpretação simbólica da Bíbia e da agadah." (Cabala, p. 61).

(אלעזר מוורמייזא) Eleazar de Worms

No que diz respeito aos escritos de Eleazar de Worms, há evidências de que ele tinha familiaridade com essa terminologia, particularmente em relação ao simbolismo da Shekinah. A Sepher ha-Bahir não continha uma teoria completa das Sefirot e muitas das afirmações nele não seriam compreendidas nem mesmo pelos Kabbalístas mais antigos na Europa ocidental.

Lá, aparece a teoria da transmigração de almas e ela é apresentada como um mistério, uma ideia autoexplicativa (axiomática) em si e que não necessita de justificação filosófica, apesar da oposição de filósofos judeus desde o tempo de Saadia.

O massacre dos judeus em Metz, noroeste da França, durante a primeira cruzada.
O Livro Raza Rabba é considerado uma das fontes do Bahir. Existem outras fontes ignoradas.

Sobre a antiguidade de certas crenças qabbalísticas, podemos citar a Brit HaDashah, que mostra, nos 4 evangelhos, cerca do primeiro século, o Rabboní Yéshua usando o termo em grego:

A palavra "aeons" as manifestações divinas em determinadas eras astronômica.

Tradução:

"Enquanto estava sentado no monte das Oliveiras, os discípulos vieram ter com ele em particular, dizendo: Diz-nos, quando serão estas coisas? e qual será o sinal da tua vinda, e do fim do mundo?"

Os Perushim

Seguindo uma perspectiva ascética, Jacob Nazir pertenceu a um grupo especial chamado de perushim no dizer rabbínico e naziritas na terminologia bíblica (lembrem-se do movimento nozirit), cujos membros não praticavam o comércio, mas eram sustentados por suas comunidades de modo que pudessem dedicar todo o seu tempo à Torah. Pela própria natureza, esses indivíduos levavam uma similaridade com os chassidim, e há evidências de que alguns deles levavam uma vida chassídica.

A ideia de Kavod, no sentido saadiano (Saadia Gaon) simples, não foi considerada particularmente um mistério, mas interpretações em consonância com o espírito da teoria das Sefirot na Bahir foram sempre consideradas "o grande mistério".

Assim elabora Gershom Scholem, na p. 63 da sua obra Cabala:

"Versões judaicas de teorias neoplatôpnicas do Logos e da Vontade Divina, da emanação e da alma, agiram como poderosos estimulantes. Mas as teorias filosóficas a respeito do Intelecto Ativo enquanto força cósmica, com o qual era possível aos profetas e aos poucos escolhidos se associar, também penetraram nesses círculos. A íntima proximidade dessa teoria com o misticismo se destaca claramente na história do misticismo medieval islâmico e cristão e, sem surpressa, age como importante elo na cadeia que conecta muitos cabalistas com as ideias de Maimônides."

Assim, segundo esse grande historiador e exegeta da cabala, o real significado histórico dessa ciência pode ser identificado como produto da interpretação do gnosticismo judaico com o neoplatonismo. O qual sistema se encontra nas raízes tanto do islamismo quanto do cristianismo.

A Provença e a sublevação no mundo cristão

Nos anos seguintes ao século XII, a cabala se espalhou para além do círculo de Abrahão b. David de Posquières. Nesse momento, o encontro entrea tradição gnóstica contida no Bahir e as ideias neoplatônicas a respeito de Deus, Sua emanação, como também o lugar do homem no mundo foi extremamente recompensador, levando à mais profunda interpretação dessas ideias e teorias místicas já conhecidas.

Nesse período, a Provença foi o palco de uma intensa sublevação no mundo cristão, quando a seita dos cátaros assumiu grande controle da maior parte de Languedoc, onde os primeiros centros de estudos cabalísticos estavam localizados. Para muitos historiadores ainda não ficou claro em que medida houve, ou não, uma conexão entre a explosão no judaísmo nos círculos dos perushim e dos chassidim e a profunda revolta na cristandade que encontrou expressão no movimento catarista, esse movimento que mesclava elementos do gnosticismo e do neoplatonismo.

No campo da ideologia, não há nada em comum entre as ideias dos cabalistas e as ideias dos cátaros, exceto na questão da transmigração, que os cabalistas herdaram de fontes orientais do Sepher ha-Bahir. Em tese, a teologia dualista dos cátaros opunha-se à opinião dos judeus; mesmo que o dualismo seja uma percepção oriunda da mente humana, através dos 5 sentidos.

O Hilchot Teshuvah - Abrahão b. David

Abrahão b. David, em sua obra crítica a Maimônides (Hilchot Teshuvah, 3-7) apresenta uma defesa da corporeidade de Deus e também interpreta a agadah em Eruvim 18a, de que Adão foi a princípio criado com duas faces. Ele também tese uma reflexão sobre a especulação cabalista sobre os atributos divinos - as Sefirot.

Já o seu filho, Isaac o Cego (morto por volta de 1235), que viveu em Narbonaou na região, dedicou sua inteira obra ao misticismo e reuniu mutos seguidores na Provença (França) e na Catalunha (Espanha).

No topo de suas prioridades quanto as qualidades divinas, Isaac, o Cego pos o pensamento (machshavah), do qual emergira as frases divinas, "as palavras" que que originaram o mundo. Acima desse pensamento, ele colocou o Deus Oculto, que é chamado pela primeira vez de pelo nome de Ein-Sof ("o Infinito"). Segundo ele, o pensamento do homem ascende através da meditação mística até alcançar e ser completamente absorvido pelo "Pensamento' Divino.

Quando analisamos as palavras originais, não nos enganamos.

Tradução:

Sois de Deus, neófitos, e os vencestes: porque maior é aquele que está em vós, do que aquele que está no mundo.

Os termos iniciatórios revelam a verdadeira natureza gnóstica dos escritos cristãos.

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Saadia Gaon e o Éter

Na sua teoria sobre o Kavod (Glória de Deus), o Saadia Gaon faz um comentário ao Sefer Ietsirah no qual ele faz conexões que podem ser encontradas na tradução do Emunot ve-De'ot. Estas se referem ao fato de que "o éter seria impossível de ser abarcado. A ênfase no misticismo das luzes do intelecto é próxima em espírito, embora não em detalhes, da literatura noeplatônica posterior, como, por exemplo, o Livro das Cinco Substâncias de Pseudo-Empédocles (da escola de Ibn Masarra na Espanha). Por exemplo, os essências superiores que nos são reveladas, segundo o Sefer ha-Iyun e diversos outros textos, a partir do "mais alto mistério oculto" ou da "treva primordial", são elas: a sabedoria primordial, a luz maravilhosa, o chashmal , a neblina (arafel), o trono de luz, a roda (ofan) da grandeza, o querubim, a roda da Carruagem, o éter circundante, a cortina, o trono da glória, o lugar das almas, e o lugar externo do sagrado.

Todos esses conceitos estão inseridos dentro do texto em hebraico, e estão virtualmente inacessíveis para o leitor típico por meio de traduções.

Nos aprofundaremos muito mais, ao passo que começarmos a ler extratos dessas obras medievais através de aulas ao vivo, como um reforço ao tema geral desse curso da história da Kabbalah.

O processo de expansão das crenças filosóficas de natureza metafísica, como a verdadeira natureza do ser (ontologia) se espalgaram e chegaram até influenciar a obra Divisione Naturae de João de Escoto de Erígena, sendo parte da grande discussão sobre os "Universais", mas ainda falaremos mais sobre isso.

Na nossa próxima Aula 07, iremos conhecer o legado da escola de Girona, na Catalunha, Espanha, no século XIII.

Shalom a todos!

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